18.10.2022 às 08:10h - Economia
Você já parou para pensar o que realmente impacta no preço dos alimentos? Algumas situações como alta da inflação, crise energética, guerra no leste europeu e até mesmo condições climáticas podem ser fatores decisivos no preço final dosalimentos. O ND+ conversou com alguns especialistas para poder entender melhor o que interfere no preço dos alimentos até a chegada ao supermercado.
Utilizamos o arroz e o feijão como exemplo, já que a dupla é um prato mundialmente conhecido e consumido por praticamente todos os brasileiros.
No entanto, muita gente não sabe o porquê de o preço médio tanto do arroz quanto do feijão terem sofrido variações de preço significativas nos últimos meses.
A produção de feijão catarinense é na sua maioria voltada ao mercado interno. A formação do seu preço depende de diversos fatores, como: diferentes variedades do feijão; o tempo de armazenagem – o feijão novo (recém-colhido) é mais valorizado; a qualidade do produto – o feijão de primeira safra oferece ao mercado um produto de melhor qualidade que o de segunda safra, e a demanda – durante as férias escolares e festividades de final de ano, a procura pelo produto é drasticamente reduzida.
A produção de feijão em Santa Catarina é composta por duas safras. A primeira, chamada de safra das águas (feijão 1ª safra), representa cerca de 60% da produção, e a segunda safra, também chamada de safra da seca (feijão 2ª safra), responde por 40% da produção total estadual.
Para Santa Catarina, o período de plantio para o feijão da 1ª safra vai de agosto a dezembro e para o feijão da 2ª safra, de janeiro a março.
A primeira safra costuma resultar em produto de qualidade superior e com maior valor agregado, logo tende a ter um preço mais caro. Já o feijão da última safra geralmente é menos valorizado e sai um pouco mais barato da propriedade.
O agricultor Celeste Slabiski tem uma propriedade na cidade de Itaiópolis, região do Planalto Norte do Estado, onde produz feijão há mais de 35 anos. Junto com a família, produz a semente em uma área de 80 hectares (aproximadamente 80.000 m² ).
Slabiski revela que mesmo sendo um trabalho extremamente braçal e cansativo, dá muita satisfação em cultivar a semente e contribuir com o PIB catarinense. O produtor, com a ajuda do filho, colhe cerca de 300 toneladas de feijão por ano nas duas safras.
O preço dos insumos também influencia no preço final do produto. Celeste explica que os custos de produção se iniciam antes mesmo do plantio. O produtor comenta que precisa preparar o solo para receber as sementes, utilizando herbicidas para deixar o solo limpo.
Pela área de plantio da propriedade de Celeste Slabiski é preciso utilizar cerca de 720 litros de herbicida, precisando de três a quatro aplicações por safra.
O produtor utiliza, ainda, aproximadamente 900 kg de fertilizante por safra. Levando em conta que o valor médio do quilo do adubo é cerca de R$ 19, o montante final influencia no preço. Outro detalhe também, é para a adubação pós-plantio, quando Celeste utiliza cerca de 80 sacas de 60 quilos por safra.
Ainda conforme Slabiski, seu maior custo além dos fertilizantes é o óleo diesel, matéria-prima indispensável para movimentar o maquinário agrícola durante o plantio, na etapa da pulverização de herbicidas e fungicidas e no momento da colheita. O diesel também impacta no valor do transporte da produção até as cooperativas que negociam o produto e, portanto, no valor final da semente.
Comparando a safra 2012/12 com a safra 2021/22, nesta janela de nove anos, podemos verificar que ocorreu uma diminuição sistemática da área plantada, que chegou a reduzir 26,2%.
Por outro lado, a produtividade cresceu 6,6%, o que contribui para que o déficit na produção não seja maior e o preço se mantenha estável.
O analista de socioeconomia da Epagri/Cepa, João Rogério Alves, diz que produzir feijão nesta primeira safra 2022/23 ficará mais caro, uma vez que os custos de produção subiram significativamente.
Na comparação de julho/2022 com julho/2021, pode-se verificar que o custo operacional total de referência ficou 24,68% maior, puxado pelo significativo aumento dos fertilizantes (47,22%) e dos agrotóxicos (27,39%).
No seu entendimento, trata-se de um produto que possui um curto período de armazenagem na propriedade, ou seja, o produtor, assim que colhe o produto, precisa comercializar sua produção, uma vez que a qualidade do grão deprecia rapidamente com o passar do tempo, comprometendo o valor recebido pelo produto comercial.
Essas características do produto conferem desvantagem ao feijão, frente às commodities, que possuem um padrão de qualidade, têm preços mais estáveis e mercado internacional consolidado. Com isso, um fato preocupante é que a cada ano que passa, o feijão vem perdendo espaço para culturas como soja e milho.
Para tratar do assunto referente ao custo do arroz, conversamos com Rogério Pessi, produtor de arroz há mais de 30 anos em Araranguá, cidade no Sul de Santa Catarina. Sua propriedade, com 75 hectares (aproximadamente 75.000 m²), produz cerca de 480 toneladas da semente por safra, colhido durante os meses de janeiro a maio.
O arroz, assim como o feijão, também possibilita o cultivo e colheita de mais de uma safra por ano. Em terras bem preparadas com as técnicas certas, é possível extrair até três safras por ano, a última com semente de qualidade um pouco inferior.
Pessi destaca que um grande impacto no custo da produção está diretamente relacionado com os custos dos fertilizantes. O rizicultor também ressalta custo de produção elevado pelo valor do óleo diesel e da energia elétrica, uma vez que o arroz exige irrigação constantemente.
Na questão do óleo diesel, podemos destacar o valor atual do barril de petróleo em US$ 99,49 por barril (aproximadamente R$ 489,45), um aumento expressivo em um curto espaço de tempo.
Neste contexto, devemos pontuar que, diferente da gasolina, o diesel aumentou exponencialmente e não houve redução considerável do preço nas bombas.
Rogério destaca, ainda, que o produtor de arroz está inseguro frente ao mercado, uma vez que a semente ainda não é reconhecida como commoditie agrícola, como o café e a soja, por exemplo, que possuem preços mais regulados com o mercado externo e valores menos voláteis.
O arroz mais plantado em Santa Catarina é o da Epagri, conhecido como Cultivares Epagri SCS-125. A semente é responsável por 82% da área plantada no Estado, equivalente a 120 mil hectares cultivados em todo o território catarinense.
Os impactos dos custos também estão relacionados com condições climáticas. Estiagem e excesso de chuvas fazem com que a semente perca qualidade e com isso deprecia muito o valor no mercado interno.
João Rogério Alves destaca ainda que não podemos deixar de considerar que a grande oscilação de preços no mercado causa insegurança ao produtor na tomada de decisão sobre o que plantar e quanto plantar. Esse fato também prejudica no valor final, quando se planta em grande quantidade, tem mais produto no mercado, logo o valor final reduz.
Um levantamento feito pela CNA (Confederação Nacional da Agricultura) trouxe alguns dados que nos mostram melhor esse cenário: a ureia aumentou 300% em comparação com o ano passado.
O fosfato aumentou 100%, de US$ 400 para US$ 800 a tonelada e o potássio encareceu 170% e passou de US$ 290 a US$ 780 a tonelada. Todos os componentes citados acima fazem parte da cadeia dos fertilizantes.
Mas ainda segunda o produtor Rogério Pessi, os impactos mais significativos serão sentidos pelos consumidores na próxima colheita: o arroz plantado agora que será colhido em meados de fevereiro pode trazer um aumento mais acentuado. Segundo o produtor, “essa lavoura está sendo muito cara para produzir”.
Segundo a diretora administrativa da Fetaesc (Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Santa Catarina), Agnes Schipanski Weiwanko, o custo está atrelado ao alto preço dos insumos agrícolas para o plantio, onde se encaixam os adubos e fertilizantes e também agrotóxicos e fungicidas.
Outro detalhe destacado por Agnes foi o custo do maquinário para operar o plantio e a colheita. Ela destaca por exemplo que para cultivar arroz e feijão, os equipamentos precisam ser modernos para se adequar ao que o mercado exige. Por exemplo, uma colheitadeira pode chegar a custar mais de R$ 1 milhão, cerca de um ano atrás esse equipamento era adquirido por menos de R$ 600 mil.
Com todas as informações acima podemos concluir que a elevação do preço desses alimentos se apoia em alguns fatores: o principal seria realmente a alta do valor dos fertilizantes. Outro ponto observado é o valor elevado do óleo diesel que move os equipamentos do agro catarinense e, por fim, a oferta e demanda do mercado.
Fonte: ND Mais
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