16.07.2025 às 21:41h - Santa Catarina

"Muitas incertezas", diz pai de bebê que recebeu antídoto de cobra no lugar de vacina em SC

Ricardo Orso

Por: Ricardo Orso São Miguel do Oeste - SC

"Muitas incertezas", diz pai de bebê que recebeu antídoto de cobra no lugar de vacina em SC
Foto: Arquivo Pessoal

Quando o pequeno Benjamim chegou ao mundo, na última quarta-feira (9), a família Massaneiro se encheu de alegria. Os primeiros dias de vida do pequeno foram especiais para o pais, mas logo o clima de alegria se transformou em dias de preocupação. O recém-nascido é um dos 11 bebês que receberam uma dose de antídoto para picada de cobra no lugar de uma vacina contra a Hepatite B. O caso aconteceu na última semana em um hospital de Canoinhas, no Planalto Norte catarinense, e ganhou repercussão nesta terça-feira (15).

Segundo Everton Massaneiro, analista logístico e pai de Benjamim, a família ficou abalada ao receber a notícia de que o filho foi um dos bebês afetados pelo erro. Eles foram comunicados, na segunda-feira (14), pela equipe do Hospital Santa Cruz de Canoinhas, onde o pequeno nasceu.

— Quando eu recebi essa notícia, muitas incertezas passaram na minha cabeça a respeito de como continuaria a saúde do meu filho — relatou em entrevista do NSC Total.

Erro na aplicação da vacina

Everton relembra que os primeiros dias de vida de Benjamim foram como o esperado, com momentos de ajustes em família e muita felicidade pela chegada do primeiro filho. O recém-nascido foi levado para tomar a vacina da Hepatite B ainda na quarta-feira, dia do nascimento. Foi nesse momento que o erro foi cometido.

O bebê e a mãe receberam alta na sexta-feira (11), dois dias após o parto, e passaram o final de semana em casa sem saber do ocorrido.

Descoberta e revolta

A família só soube da situação na segunda (14), quando foi até o hospital para que Benjamim pudesse realizar o teste do ouvido.

— A gente recebeu mensagem de texto pela manhã, só que a gente estava correndo com o teste do ouvido, então tivemos pouco acesso ao telefone. O teste era realizado anexo ao hospital, quando estávamos saindo, a secretária chamou eu e a minha esposa e nos comunicou que uma enfermeira queria conversar conosco — conta.

Ele ainda relembra que, em nenhum momento, a troca de substância passou pela sua cabeça, já que na carteira de vacinação de Benjamim constam os dados da vacina de Hepatite B “aplicada” no dia do nascimento.

Everton chegou até a cogitar que o assunto seria sobre um mioma — tumor benigno — encontrado no útero de sua esposa durante o parto.

— Quando eu chego então na área principal do hospital, na entrada, eu vejo que tem mais pais que estavam conosco na ala da maternidade, que ganharam os nenéns naquele período. Então foram chamadas as pessoas por ordem de chegada. Quando a gente chegou lá em cima, recebemos essa notícia — relata.

Para Everton, um dos principais sentimentos ao ficar sabendo sobre o erro cometido foi a revolta. Ao entender melhor o caso, as possíveis reações e quem foi a profissional responsável, ele e sua esposa ficaram mais tranquilos.

— De início, a minha revolta foi muito grande, mas depois eu fui entendendo o caso. A mesma pessoa que aplicou essa vacina errada, foi a mesma pessoa que desafogou o meu filho, foi a mesma pessoa que fez uma lavagem no estômago do meu filho, quando as outras pessoas que estavam ali não identificaram isso. Então, tudo isso ajudou o meu filho a iniciar a amamentação de uma forma melhor — afirma.

Ele ainda conta que seu primeiro instinto foi pensar no bem-estar do filho, mas também pensou sobre a profissional. Segundo Everton, essa pessoa já tem mais de 30 anos de carreira e, até então, não havia cometido outros erros.

— Eu não posso dizer que somente essa pessoa é culpada. Existe uma equipe, existem pessoas que provavelmente fiscalizam, outras pessoas da equipe, porque também a gente sabe que aconteceu os erros no dia 9, 10 e 11. Então, é impossível uma mesma pessoa ter aplicado nesses três dias a vacina, devido à carga horária na jornada de trabalho — diz.

Como aconteceram as trocas de frascos

Os 11 recém-nascidos deveriam ter sido imunizados com a vacina contra a Hepatite B. No lugar, porém, receberam doses de soro antibotrópico, usado contra picadas de serpentes como jararacas e jaracuçus. A diretora da unidade, Karin Adur, afirmou que a similaridade dos frascos pode ter induzido ao erro.

Ao g1, ainda relatou que, como as medicações são do mesmo laboratório, o soro teria sido armazenado em um local incorreto.

— E a falta de atenção ao não ler o frasco, o que é uma das exigências para a enfermagem — afirmou ao NSC Total.

Riscos do antídoto e cuidados com bebês

O Hospital Santa Cruz de Canoinhas afirmou que os bebês receberam a dosagem de 0,5 ml do antídoto. De acordo com as informações disponíveis na bula profissional do soro, uma ampola do antibotrópico contém 10ml da substância e cada ml neutraliza no mínimo 5 mg de veneno-referência de jararaca (Bothrops sp) e 3 mg de Surucucu (Lachesis muta).

Ainda de acordo com o hospital, nenhum bebê teve efeito colateral ou complicações graves por conta da dose. Ainda, a unidade de saúde afirma que, junto às famílias, os recém-nascidos estão sendo monitorados e permanecem estáveis.

O próprio Benjamim passou por consulta e exames na maternidade já na segunda-feira (14), o que também ajudou a tranquilizar Everton e sua esposa. Até o momento, o bebê segue saudável.

— Para mim é muito complicado porque é o meu primeiro filho. Então, tem coisas que eu não sei se é comum de um recém-nascido ou se é a reação do antídoto. Isso, talvez, tira um pouco da maternidade e paternidade. Me deixa preocupado diariamente. Então, eu tô vendo o meu bebê dormindo, eu sinto que que a respiração dele está mais ofegante. Pode ser algo normal de recém-nascido, mas também pode ser uma reação daquilo que foi aplicado no meu filho — explica.

Investigação

Karin Adur esclarece que o erro foi descoberto por uma profissional do próprio hospital, durante uma conferência de rotina na sexta-feira (11). Uma sindicância interna foi aberta para apurar todos os detalhes do ocorrido, além da comunicação feita aos órgãos necessários, como o Núcleo de Segurança do Paciente do Estado.

— A sindicância será concluída nesta semana para que possam ser realizadas as medidas necessárias. O HSCC lamenta muito o ocorrido — disse a diretora.

Em nota, a Diretoria de Vigilância Epidemiológica (Dive) informou que foi notificada e monitora o caso. De acordo com o órgão, não há registro de reações graves até o momento e a orientação é manter as crianças em observação por um período de até 30 dias.

“Os erros de imunização devem ser notificados, sendo que a SES realiza o monitoramento dessas notificações e orientações quanto às condutas em situações de gravidade. Reforçamos a importância da atualização quanto às práticas de sala de vacina, a fim de impedir que situações relacionadas possam ocorrer”, afirmou a Dive.

Já de acordo com a Prefeitura de Canoinhas, a secretaria de Saúde municipal foi comunicada sobre o caso na segunda-feira (14) pela Regional de Saúde de Mafra. Em nota, reforçou que a administração da vacina não é responsabilidade do município, mas da equipe do Hospital Santa Cruz de Canoinhas, pois o erro foi cometido dentro da maternidade da unidade.

Conforme a Regional de Saúde de Mafra, todas as famílias foram avisadas e os recém-nascidos serão acompanhados pela equipe da Vigilância Epidemiológica de Canoinhas. A prefeita da cidade, Juliana Maciel, determinou a contratação de uma auditoria externa para apurar o caso. Segundo a prefeita, o município repassa cerca de R$ 1 milhão para custear os atendimentos via SUS que o hospital realiza.

Fonte: NSC Total

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