05.09.2025 às 08:11h - Geral

Vítima de gangue que traficava mulheres em SC relata rotina de abusos

Ricardo Orso

Por: Ricardo Orso São Miguel do Oeste - SC

Vítima de gangue que traficava mulheres em SC relata rotina de abusos
Foto: PF, Divulgação

Uma das vítimas da organização criminosa suspeita de traficar mulheres de Santa Catarina para a Irlanda relatou a rotina abusiva de prostituição à qual foi submetida no país. A jovem foi abordada em uma casa noturna da Grande Florianópolis por um dos integrantes do esquema, que prometeu a ela altos ganhos na Europa. Ela sabia que iria ao país para fazer programas, mas foi surpreendida pelas jornadas exaustivas, xingamentos e impedimentos de sair de casa.

— Ele disse que eu era bonita e iria fazer muito dinheiro lá fora — diz a jovem, em relato exclusivo ao NSC Total.

A vítima custeou toda a viagem do próprio bolso, mas disse que algumas meninas tinham esses custos pagos pela gangue, que depois descontava o valor dos lucros da exploração sexual de cada uma. Os criminosos controlavam os perfis delas em sites de prostituição, agenciavam os encontros e mantinham o valor dos programas em contas que somente eles tinham acesso.

Em Dublin, elas eram obrigadas a dividir casas controladas pela organização e proibidas de dormir em outros lugares. As vítimas eram forçadas a trabalhar das 9h40min até 3h ou 4h da madrugada, em jornadas que chegavam a 18 horas por dia.

A jovem conta que chegou a atender uma dezena de pessoas em um único dia. Em uma ocasião, ela foi obrigada a trabalhar menstruada.

— Às vezes ficávamos 24 horas sem dormir. A privação de sono e o cansaço eram a pior parte. Também tinha agressão verbal. Se a gente fazia alguma coisa errada, ele [chefe da organização] gritava — conta a vítima.

Multas e restrições para sair de casa

A organização criminosa impunha uma série de restrições na rotina das vítimas. Elas tinham apenas uma “folga” por mês, e não podiam sair de casa à tarde, apenas de manhã, no máximo duas vezes por semana.

— Só podia ficar até 12h. Se chegasse 12h01min, levava multa, às vezes de 150 euros — relata.

Segundo ela, as multas eram dadas “por qualquer coisa”, como deixar a música alta ou bater porta. Algumas meninas chegaram a ficar negativadas e, dessa forma, impedidas de deixar a organização.

Os programas custavam entre 150 e 250 euros e eram depositados direto nas contas da organização. Duas vezes por semana, os criminosos repassavam uma parte para as vítimas, descontando as multas e outras dívidas, como o “aluguel”, que elas faziam com o grupo.

A jovem passou alguns meses na Irlanda e diz que conseguiu sair com facilidade, por não ter dívidas. Ela conta que ganhou bastante dinheiro, mas não suportou a rotina abusiva.

— Algumas meninas iam embora. Mas uma semana depois chegava mais.

Operação prendeu oito pessoas

A organização criminosa foi alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) em conjunto com a Garda e a Europol na última quarta-feira (3). Em Santa Catarina, quatro pessoas foram presas em Florianópolis, São José, Palhoça, Biguaçu e Camboriú. Mais quatro pessoas foram presas na Irlanda.

De acordo com o delegado regional da PF Farnei Franco Siqueira, 70 vítimas foram identificadas até agora. A maioria é catarinense. Elas eram aliciadas em baladas, clubes e na comunidade por integrantes da organização.

Depois de convencê-las, o grupo pagava passagens e as mandava para o exterior, onde ficavam alojadas e eram exploradas sexualmente em casas pré-estabelecidas e por meio de anúncios na internet, conforme a PF. A investigação estima que o grupo lucrava o valor bruto de R$ 100 mil por mês com cada vítima. As mulheres recebiam parte do lucro da exploração, enquanto o restante ficava com o grupo criminoso, conforme a PF.

Segundo o delegado Siqueira, mesmo que as mulheres viajassem para a Irlanda sabendo que fariam programas, a forma como isso acontecia configura crime de tráfico de mulheres para exploração sexual.

— As vítimas tinham conhecimento, mas elas eram colocadas em uma situação degradante, em que não se viam com outra alternativa, que não trabalhar nessa forma de exploração. No momento que elas chegavam no exterior, claro, tinha a questão do lucro, mas tinha uma série de situações que elas ficavam em uma verdadeira prisão — disse o delegado, à imprensa.

Segundo a PF, os alvos da ação eram todos brasileiros, responsáveis pela mediação e remessa das mulheres. Eles também são suspeitos de lavar dinheiro através da aquisição de bens, veículos e imóveis, além investimentos em empresas e criptoativos, conforme o delegado.

Fonte: NSC Total

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